Urbanização e droga facilitam exploração sexual de crianças
Por Sarah Fernandes, do Aprendiz |
Foi nas proximidades da Cidade Baixa de Salvador (BA) que a jovem M. E. foi resgatada pela polícia baiana e encaminhada a um abrigo público. Com apenas 14 anos, ela foi induzida à exploração sexual pelos pais. O dinheiro obtido era utilizado para comprar crack, no qual os três eram viciados.
No carnaval seguinte ao caso, a polícia flagrou outra menina da mesma idade praticando atos sexuais com um homem adulto. Ela declarou que era explorada desde os 11 anos, também para comprar crack. Os casos ficaram na memória da delegada Ana Cricia, da Delegacia de Repressão a Crimes contra a Criança e o Adolescente de Salvador, que declara que histórias de exploração sexual envolvendo drogas não são incomuns.
As observações de Ana apontam uma tendência: a soma dos fatores drogas e periferias urbanas tem grande potencial para resultar em exploração sexual pessoas com menos de 18 anos. A avaliação vem do Mapeamento dos Pontos de Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes nas Rodovias Federais Brasileiras, divulgado na última quarta-feira (6/10) pela Polícia Rodoviária Federal.
A pesquisa levantou 1.820 pontos vulneráveis à exploração sexual de crianças e adolescentes nas rodovias federais. Eles apresentam prostituição adulta, tráfico ou consumo de drogas, presença constante de crianças e adolescentes e ocorrências de exploração de pessoas com menos de 18 anos nos últimos dois anos. Os pontos foram divididos nas categorias Crítico, Alto, Médio e Baixo, de acordo com o grau de vulnerabilidade.
Ao todo, 37% dos 924 pontos considerados críticos apresentaram tráfico ou consumo de drogas, segundo o mapeamento.
“A exploração sexual de crianças acontece em redes que muitas vezes estão ligadas ao tráfico de drogas”, conta Jacir Pinheiro, coordenador do programa de denúncias Disque 100, que apoiou o mapeamento. “As meninas acabam usando drogas pela proximidade com a contravenção e como uma válvula de escape. Outras já usavam e se prostituem para manter o vício”.
Entre os pontos vulneráveis, 67,5% se concentram em áreas urbanas, próximas às rodovias. “Isso porque as cidades têm mais pessoas, mais riquezas e maior trânsito de passageiros”, explica Pinheiro. “São regiões das cidades que não tem estrutura para atendimento à criança, como conselhos tutelares”, completa.
O perfil do jovem explorado é padrão: são meninas, adolescentes, pobres, negras ou pardas, com histórico de violência doméstica, segundo o coordenador do Disque 100. “Elas estão em desenvolvimento físico e psicológico. Quando adultas podem ter problemas para confiar em pessoas e dificuldades com sua sexualidade, além de doenças, gravidez precoce e uso de drogas”, observa.
Nordeste
A Região Nordeste concentra o maior número de pontos de vulnerabilidade: 545, mais que as regiões Centro-Oeste e Norte juntas (505). “A pesquisa foi feita em rodovias federais e o Nordeste possui grande parte das vias”, observa Rosana Junqueira, coordenadora de projetos da fundação Childhood Brasil, que apoiou o mapeamento. “Os pontos são de vulnerabilidade, o que não significa que realmente ocorram casos”, ressalta.
A BR 116 é a rodovia com mais pontos de vulnerabilidade, com 262, seguida pela BR 101, com 187. São Paulo apresenta a maior concentração: um ponto a cada 11,6 quilômetros. Porém, a Bahia possui o maior número de pontos críticos: 117, ou 12,7% da malha viária federal do estado. Ao todo, é um ponto critico a cada 47,8 quilômetros de estrada.
Para a delegada Ana Cricia, da Delegacia de Crimes contra a Criança de Salvador, a atuação da polícia é difícil. “Os casos não acontecem no meio da rua. Muitas vezes os responsáveis não denunciam porque se valem da situação e as adolescentes não procuram a polícia porque não sabem que podem pedir ajuda ou porque tem vergonha”.
As vítimas de exploração sexual de Salvador são levadas ao Conselho Tutelar, que as encaminha para abrigos públicos. O munícipio possui um abrigo especializado no atendimento a vítimas de violência sexual, chamado Sam e Jô.
Mapeamento
A pesquisa começou em 2009, com um questionário entregue a caminhoneiros, que deveriam apontar dois locais em estradas federias onde se depararam com suspeitas de exploração sexual de crianças.
Com 200 indicações em mãos, a Polícia Rodoviária Federal elegeu os dez pontos com maior propensão a prostituição de menores e realizou visitas aos locais. Em todos foram encontrados casos de jovens explorados sexualmente.
Eles então observaram as características do local que poderiam facilitar a exploração — como tráfico de drogas e baixa iluminação — e criaram uma lista. Se determinado local apresentasse os fatores da lista era classificado como vulnerável. A partir daí passaram a percorrer as estradas levantando pontos com tais características.
A ideia é que, com os dados em mãos, a polícia realize ações direcionadas para combater o problema. “É preciso que o estado fortaleça as redes locais de proteção à criança e que a sociedade esteja mais atenda aos direitos da criança e do adolescente”, sugere Jacir Pinheiro, do Disque 100.
Para ler a pesquisa completa, acesse http://aprendiz.uol.com.br/
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