PSIU POÉTICO 30 anos - História do maior encontro ininterrupto de poesia no Brasil começou na década que restaurou a democracia no Brasil
Poetas mineiros, participantes do Psiu Poético,
na Casa das Rosas, em São Paulo - março 2016
Por Aroldo Pereira
A 2ª metade do século XX no
Brasil foi foda! Houve momentos de total dificuldade & temor, assim
como fendas para a inquietação, invenção & luzes, fazendo contraponto com o
inferno.
Foram anos de
efervescência, loucura, tristeza pesada & criatividade intensa.
Foi nessa
época que João Gilberto & cia apresentaram ao mundo a Bossa Nova; Juscelino
Kubitschek pensou & ergueu Brasília; os irmãos Campos, Décio Pignatari
& Ferreira Gullar tocaram o Concretismo; Torquato Neto, José Carlos
Capinan, Rogério Duprat, Nara Leão, Gal Costa,Tom Zé, Caetano Veloso &
Gilberto Gil presentearam a todos com o Tropicalismo; Márcio Borges, Fernando
Brant, Murilo Antunes, Beto Guedes, Lô Borges & Milton Nascimento deram ao
mundo o Clube da Esquina. Os políticos de direita, os conservadores, cidadãos
indecisos & os militares impuseram ao país por varias gerações a
covarde ditadura militar; Glauber Rocha, José Pedro de Andrade, Nelson Pereira
dos Santos fluíram com o Cinema Novo, José Celso Martinez Corrêa, Augusto Boal
& Flávio Rangel contribuíram com o teatro buscando liberdade liberdade.
Contra os verdes negros anos ditatoriais surgiram diversas & geniais
publicações alternativas: Pasquim, Binômio, Mulherio, Opinião, Novos Tempos,
Lampião da Esquina, Luta & Prazer, Brasil Mulher, Movimento, Coojornal, O Repórter, entre tantos & instigantes outros.
Na mesma leva
foram publicadas as revistas Realidade, Flor do Mal, Bondinho, Káthedra, Nave
Louca, Música do Planeta Terra, Espaço de Prática Poética, Bric-a-Brac &
muitas, muitas, muitas outras publicações
libres. E foram elas que fizeram a minha
cabeça de menino inquieto, inventor & buscador do impossível.
As mulheres poetas & os poetas
homens, que contribuem com a antologia Trinta
Anos Luz Poetas celebram 30 anos de Psiu Poético nasceram, cresceram, vivendo
no decorrer & na morte lenta da famigerada ditadura. E seus versos não
necessariamente precisam dizer sobre isso.
Nós, jovens,
poetas, pensadores, artistas catrumanos do norte de Minas Gerais,
moradores de Montes Claros, cidade que deu ao Brasil Cyro dos Anjos, Darcy
Ribeiro, João Luiz Lafetá & incontáveis pensadores/criadores da arte literária
ainda desconhecidos do imaginado público leitor, sentíamos muito vazio
& uma tristeza sem fundo no início da década de 80. Com esse sentimento
resolvemos criar o Grupo de Literatura & Teatro Transa Poética, para
preencher 01 pouco aquele oceano de angústia & criar alguns
acontecimentos poéticos, políticos, culturais, sexistas, existenciais, gozosos,
amorosos, para as pessoas da nossa geração & para as outras que tinham
abertura & discernimento para compartilhar de momentos tão impares.
Com o Transa Poética ocupamos várias cenas culturais pelo Brasil adentro, com
apresentações em bares, escolas, carrocerias de caminhão, teatro, praias,
metrôs, galerias, piscinas, praças, ruas, estações, coletivos urbanos... nunca
nos negamos a ocupar espaço.
Fizemos
muitas revoluções. O artista plástico Raimundo Colares & o pensador
Jorge Mautner sempre foram nossos parceiros nesse propósito & em diversos
outros. Nosso trabalho com o Grupo Transa Poética inquietava muita gente, mas
mesmo assim sentíamos necessidade de criarmos + & + .
Estávamos
viajando com o espetáculo “Feras Deveras: o olhar feminino da poesia”, com
trilha sonora do Jorge Mautner & fomos nos apresentar na Universidade de
Brasília (UnB), dentro da programação do Festival Latino- Americano de Arte
& Cultura (FLAAC), & foi estupendo. Participamos de uma oficina
de poesia com Thiago de Mello & Ernesto Cardenal, & da Oficina de
Musica & Invenção com o bruxo Hermeto Pascoal. Saímos de lá cheios de
energia & disposição para continuar a “criar & parir com dores”.
Foi assim que
resolvemos criar o Salão Nacional de Poesia Psiu Poético, que agora celebra 03
décadas de pau dentro, ininterruptamente. Em vários momentos quase desistíamos
de continuar com essa revolução anual. Mas como fazer isso, se em certos
momentos da história contemporânea de Montes Claros o acontecimento Psiu
poético foi o único espaço (& de quando em quando ainda é) onde se poderia
respirar com liberdade & criar outras possibilidades de interação? Tanto que até hoje a gente inclui na
programação este toque mágico: “surgirão novas programações durante o Psiu
Poético conforme a vontade dos participantes”.
E não podemos esquecer que o nosso
Psiu surgiu na década de 80 do século passado. Fazemos parte da juventude que
desabrochou lutando pela abertura política em nosso país. Fizemos parte das
pessoas que foram às ruas pelas “Diretas Já”. E continuamos a lutar por 01 país
que mantenha sua democracia plena em todos os campos da ação. Foi exatamente
nas ruas que conseguimos dar fim ao regime de exceção que atrasou & aleijou
a nossa nação por anos e anos e anos de atrocidades & desrespeito
às diferenças de pensamento & aos direitos humanos.
Com a
bandeira da liberdade hasteada pelas ruas do país foi reformulada &
promulgada a Carta Magna, a constituição da República Federativa do Brasil de
1988. Essa nossa constituição cidadã foi promulgada no dia 05 de outubro
quando o Salão Nacional de Poesia Psiu Poético estava no 2º dia de programação
do seu 2º ano de vida. O Psiu sempre acontece entre 04 & 12 de outubro em
Montes Claros.
Na década de 80 duas das principais vertentes poéticas da cena brasileira
saíram de circuito para entrarem plenamente na história: o mineiro Carlos
Drummond de Andrade & o paranaense Paulo Leminski.
Isso pode
querer dizer muita coisa, mas também pode querer dizer coisa nenhuma.
Importante é
saber que continuamos a desenvolver esse trabalho maluco & sedutor em todos
os sentidos, que é o Salão Nacional de Poesia Psiu Poético: 01 acontecimento de
revolução contínua com muita invenção & manha, mantendo a pira da palavra
acesa, iluminando o edifício dessa tal arte chamada poesia.
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