Obrigatoriedade do diploma de Jornalismo: A questão é mais simples do que parece

Por Carlos Luz *

O Supremo Tribunal Federal (STF) declarou inconstitucional a exigência de diploma de nível superior para o exercício da profissão de jornalista. O Ministro Gilmar Mendes foi o relator do Recurso Extraordinário e votou contrariamente à exigência do diploma. O voto do relator foi acompanhado por outros sete Ministros. Apenas o Ministro Marco Aurélio de Melo votou pela permanência da exigência do diploma e dois outros Ministros não estavam presentes na sessão.
A decisão foi lamentada pelo presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Maurício Azedo. A ABI tem razões especiais para lamentar esse fato, pois, já em 1918, há mais de 90 anos, organizou o 1º Congresso Brasileiro de Jornalistas e aprovou a necessidade de que os jornalistas tivessem formação de nível universitário.

O Colégio de Presidentes de Conselhos Seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), por unanimidade, também lamentou a decisão do STF. Em nota oficial, 27 presidentes da OAB dos Estados e Distrito Federal, apoiaram o presidente nacional da entidade, Cezar Britto, que já havia se posicionado contra a decisão do STF. O Secretário Geral da Federación Internacional de Periodistas, Paco Audije, também se posicionou contrário à decisão. A diretoria da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) considerou a decisão como “um retrocesso institucional e acentua um vergonhoso atrelamento das recentes posições do STF aos interesses da elite brasileira”.

Em seu discurso o Ministro Gilmar Mendes defendeu a inconstitucionalidade da exigência do diploma para o exercício profissional do Jornalismo e em determinado trecho, lamentavelmente, mencionou as atividades de “culinária e corte e costura”, atividades profissionais para as quais não são exigidos diplomas. Ressalto que não tenho nada contra os profissionais das áreas de culinária e corte e costura, ao contrário, são profissões dignas e relevantes, a alimentação e o vestuário são aspectos importantes da cultura de um povo. No entanto, são profissões que realmente necessitam apenas de um saber técnico, diferentemente da profissão do comunicador social habilitado em jornalismo. A comparação do Senhor Ministro é descabível e só demonstra o despreparo do STF em julgar a causa, e mais, tenho a certeza de que o Excelentíssimo Senhor Ministro Gilmar Mendes, ele sim, quis rebaixar a profissão do comunicador social habilitado em jornalismo ao fazer tal comparação, faltando com o respeito a todas as profissões citadas.
Como um Senhor que tem nas mãos as mais importantes decisões judiciais do país pode agir de tal forma?

Para o STF, Filosofia, Sociologia, Ética, História da Comunicação, História Social, Economia, Cultura, Metodologia da Pesquisa, Estatística, Psicologia, Política, Antropologia, Jornalismo Comunitário e Alternativo, nada disso é importante para se formar um bom profissional. Basta, quem sabe, saber escrever ou empunhar um microfone. Pois foi isto que o STF enfatizou, ao tomar a decisão de jogar o diploma dos profissionais de comunicação social com habilitação em jornalismo na lata do lixo.

Os que arrotam que o jornalismo é uma profissão apenas técnica vão logo dizer: isto tudo é “conversa pra boi dormir”, eu diria mais: é “conversa pro povo dormir”. O tecnicismo na profissão de jornalista só interessa aos que estão bem instalados no poder e não querem nenhuma mudança na estrutura sócio-econômica e cultural do Brasil, pois jornalista desinformado não informará a população, já tão massacrada pela grande mídia, a citar: Redes de televisão e rádio e grandes jornais e revistas, verdadeiros monopólios da informação manipulada.

A afirmação de que a exigência do diploma fere a liberdade de expressão, o direito de opinião e o livre acesso aos veículos de comunicação é uma grande falácia. Articulistas, cronistas, colunistas, colaboradores e especialistas de todas as áreas sempre tiveram seus espaços garantidos em qualquer veículo de comunicação sério. A exigência do diploma e do Registro Profissional regulamenta uma das mais importantes profissões, não só do Brasil, como do mundo. Os Senhores Ministros, contrariando a vontade da população, que já havia se manifestado em inúmeras pesquisas, ignoraram a importância do profissional de jornalismo e demonstraram as qualidades de um sistema judiciário atrelado (“que anda sempre atrás de alguém”) ao poder, não aos interesses da maioria da população. Os Senhores Ministros do STF, a mais alta corte do país, foram irresponsáveis, incompetentes ou agiram de forma ciente do que estavam fazendo? Se o último caso prevalecer, a decisão envolvendo a obrigatoriedade do diploma ou não se torna muito clara.

Apesar de todas estas conjecturas teóricas, a questão, a meu ver, é muito mais simples do que parece. A decisão do STF está ligada ao capitalismo, ao poder e à luta de classes. Ao tomar a decisão de considerar inconstitucional o inciso V do art. 4º do Decreto-Lei 972 de 1969, que fixava a exigência do diploma de curso superior para o exercício da profissão de jornalista, o STF se posicionou favoravelmente aos grandes monopólios da informação, empresas que prezam unicamente o lucro em detrimento da prestação de serviço, com isto, agiu contrariamente aos jornalistas responsáveis e à população brasileira, que carece da informação de qualidade.

É mais do que óbvio que as grandes corporações que controlam a informação não contratarão, como querem fazer crer, sociólogos, economistas, médicos, psicólogos, advogados, engenheiros e outros profissionais qualificados para exercerem a profissão de jornalistas, mas sim “repórteres” tendo, talvez, o ensino fundamental completo, a baixo custo, que escreverão, dirão e mostrarão o que os barões da informação querem, ou serão substituídos por mão de obra da mesma qualidade e capacitação do demitido. Este é o interesse dos monopólios da informação e este é o futuro da imprensa no Brasil.

É tão claro quanto um dia de sol intenso, a saber: “A derrubada da obrigatoriedade do diploma foi celebrada por veículos como O Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo e Rede Globo, e entidades que congregam os órgãos de comunicação, como a Associação Nacional de Jornais (ANJ), a Associação Paulista de Jornais (APJ) e a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert)”, trecho de artigo publicado no site do Sindicato das Empresas de Rádio e Televisão do Estado de São Paulo, entidade patronal que encabeçou o Recurso contra a obrigatoriedade do diploma. Mais claro do que isto, impossível.

(*) Carlos Luz é bacharel em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo. Vive em Foz do Iguaçu, Pr.

Fonte: Guatá-Cultura em Movimento
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