Santa Maria: tragédia, afeto, superação

Por Abilio Pacheco*

Gosto de cidade, cidades, e tenho uma preferência pelas chamadas cidades médias. Nunca estive em Santa Maria, teria ido ano passado a primeira vez, mas ventos mudaram meu intento. Apesar disso, tenho um carinho muito grande pela cidade que conheço de ouvir, de fotos e de navegação pelo wikimapia. O fato de ter lá uma colega de magistério superior, cuja pesquisa é no mesmo tema do que venho desenvolvendo, e por isso termino por conhecer de leve e admirar daqui do meu norte tanto o trabalho quanto a pessoa, devem reforçar esse meu afeto inexplicável por Santa Maria.

Não é um desejo utópico, apenas afeto. Dela sei mapa, perfil de população (provavelmente bem diverso do que experimentarem in loco), alguns costumes, temperatura e clima. Tenho certeza que não vou me perder ao caminhar pela UFSM, mesmo porque a experiência de caminhar por um campus que conheci apenas pelo mapa já é recorrente em mim. Ontem, para saber mais sobre as atividades do campus e tomar ciência de algum evento acadêmico para ir, inscrevi-me no grupo do facebook de letras-ufsm.

Venho, então, nutrido uma afeição por Santa Maria de mais a mais. Tanto que ligar a tv nesta manhã de domingo acendeu em mim esse sentimento de empatia conhecido e humano, mas ao mesmo tempo estranho. A primeira informação que tive foi de 80 mortos, jovens mortos, universitários numa boate, num show… Jovens, como eu fui, ávidos por uma diversão. As notícias vão dando outros e outros números. Constam que estavam mais de mil jovens na boate Kiss. Nunca que caberiam no Yara Clube, onde só estive uma vez, uma quantidade tão grande de pessoas.

Eu pouco me dou conta do absurdo. Não cabe na minha cabeça pensar em mil pessoas numa festa na Santa Maria de 270 mil que criei na minha cabeça. Mil pessoas é quase meio por cento da população!! Provavelmente não haja uma rua, ou até uma casa/família, que não tenha uma história para contar sobre a tragédia. Mesmo os sobreviventes são vítimas e continuarão sendo vítimas desse incêndio. Há pouco Dilma fez um pronunciamento, e, mais que as palavras e o apoio institucional, a dificuldade de expressar esse lamento. As palavras não o menor sentido – mais ou menos como afirmou o poeta gaúcho F. Carpinejar.

Eu, que escrevo do distante estado do Pará, digo a todos de Santa Maria e região: nós estamos todos abalados como vocês, tristes como vocês, apreensíveis como vocês… pena, o único gesto permitido pela distância é este através de palavras. A cidade que criei na minha cabeça é feita por pessoas capazes de vencer desafios, superar adversidades. Continuarei com o meu afeto nada ínfimo por ela e por todos que nela residem. Quando eu estiver passeando ou trabalhando por aí, vou olhar nos rostos de todos vocês, todos parceiros meus de humanidade, embora nenhum vizinho ou parente, e verei o quanto vocês foram capazes de passar isso.

Belém/Capanema, 27 de janeiro de 2013.

*Abilio Pacheco, professor, escritor.
Professor universitário, escritor de prosa e verso, revisor de textos e organizador de antologias. Mestre em Letras (UFPA) e doutorando em Literatura (THL-UNICAMP). Três livros publicados e um romance no prelo. É membro correspondente da Academia de Letras do Sul e Sudeste Paraense (com sede em Marabá), Cônsul dos Poetas Del Mundo para o Estado do Pará, Embaixador da Paz pelo Cercle Universal des Ambassadeurs de la Pax (Genebra-Suiça) e faz parte da AVSPE.




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