O poeta Bueno de Rivera e a sensibilidade da palavra


Por Carlos Lúcio Gontijo*


Somos todos acadêmicos e literatos à medida que nos deixemos tocar pela beleza e pela sensibilidade da palavra escrita. Serei breve em minha fala, pois me remeterei a Bueno de Rivera, um poeta maior, um fazedor de horizonte, um receptor de luzes, cuja chama não se transpõe, ou melhor, recusa-se a ficar inteiramente no papel; é calor que só o coração e o espírito podem acolher, conter e guardar. Bueno de Rivera, agora patrono da cadeira 15 que ocupo na Academia de Letras do Brasil-Mariana (ALB-Mariana), era o nome artístico do mineiro Odorico Bueno, que há muito é considerado um dos maiores poetas da língua portuguesa, com tradução em diversos países e referência obrigatória para todo e qualquer estudioso da verdadeira poesia feita no Brasil.

Bueno de Rivera nasceu em 1911, na cidade mineira de Santo Antônio do Monte, município do Centro-Oeste de Minas Gerais, onde eu passei minha infância, parte de minha juventude e bate lá o meu coração. Era menino ainda quando, pela primeira vez, ouvi a citação de seu nome. Não por um professor ou sequer um estudante, mas por intermédio do pedreiro João Bueno, que à época trabalhava em uma reforma na casa de meus pais e se gabava de ser parente do festejado poeta.

Em 1976, tive o prazer e a honra de conhecer o grande poeta mineiro Bueno de Rivera, em visita a seu apartamento, na região central de Belo Horizonte, e imediatamente me lembrei do pedreiro João Bueno, pois me deparei com uma pessoa simples, um engenheiro da palavra – tijolo por tijolo –, um intelectual avesso a qualquer tipo de badalação e devotado pai de família. Infelizmente, por seu recato e discrição, o incomparável Bueno de Rivera permanece autor desconhecido do grande público até os dias de hoje, como costuma acontecer com os que, como ele, Emílio Moura e Henriqueta Lisboa – por exemplo – se entregam de forma voluntária ao isolamento e à escassa divulgação em solo das Gerais. Contudo, como ia dizendo, procurei o poeta Bueno de Rivera com o intuito de solicitar um prefácio para o meu segundo livro (Leite e Lua).

Bueno não se fez de rogado, mas com jeitinho bem mineiro cuidou de me dar alguns conselhos sobre a busca de estilo próprio e a indispensável lapidação do dom que carregava comigo. Pois bem, como para bom entendedor meia-palavra basta: lancei o livro prefaciado pelo poeta mineiro de Santo Antônio do Monte em 1977 e, seguindo as orientações do mestre, só voltei a editar dez anos depois, quando me julguei mais bem preparado. Lamentavelmente, Bueno de Rivera faleceu em 1982, deixando-nos três importantes livros de poesia: Mundo Submerso (1944); Luz do Pântano (1948); e Pasto de Pedra (1971). E só não publicou mais obras literárias porque o enorme sucesso de crítica não lhe trazia o necessário retorno financeiro e, com família para criar, ele – mineiro pé no chão, homem da montanha – optou por ganhar o pão de cada dia exercendo outras atividades, como a publicação do “Guia Rivera”, livreto vendido nas bancas de jornais e revistas, que trazia o número, o trajeto e o ponto de todos os ônibus coletivos da capital mineira. Porém, seus livros jamais deixaram de ser lidos e comentados nos altares iluminados dos amantes da boa poesia mundo afora.

Ainda recentemente, Bueno de Rivera foi premiado com a publicação de vários poemas seus numa bela seleção feita por Affonso Romano Sant’Anna, onde seus versos luzidios, enxutos e precisos arrancaram aplausos e, mais uma vez, semearam conscientização e sensibilização do ser humano, como em O Apocalipse do Aleijadinho:

Dobram os sinos
do Carmo
— pelo ricaço
— pelo devasso.

Dobram os sinos das Mercês
— pelo ouvidor
— pelo marquês.

Dobram os sinos
choram os sinos
pelos Nobres blão
pelos Brancos blão
— pelo Aleijadinho N Ã O!


*Carlos Lúcio Gontijo Poeta, escritor e jornalista
(Discurso de posse na Academia de Letras do Brasil-Mariana) http://www.carlosluciogontijo.jor.br/

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Deixo aqui, como autor e leitor virtual, o meu agradecimento pela sensibilidade de cessão de espaço a quem queira dar sua opinião dentro da busca de contribuir para a construção de um mundo melhor, que só pode se tornar uma meta possível à medida que todos nós nos abramos ao diálogo e à cooperação.
Enfim, parabenizo ao Instituto Imersão Latina (IMEL) pela filosofia social, literária, humana e humanitária por que se faz guiar. Abraços.
Carlos Lúcio Gontijo
www.carlosluciogontijo.jor.br

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